Acervo: o primeiro contato com a Amazonas 1500

Duas Rodas publicou com exclusividade em setembro de 1978 a primeira avaliação da unidade pré-série da motocicleta desenvolvida no Brasil

23/06/2015 02:06

Texto: Josias Silveira            Fotos: Mário Bock

Matéria originalmente publicada na edição 39 de Duas Rodas, de 1978.

É nacional, de grande cilindrada e deverá ser produzida em série. Sua denominação Amazonas é coerente com o veículo: grande e brasileiro. Mas não se trata de um salto da tecnologia nacional, ultrapassando o que já existe de know how japonês, europeu ou mesmo norte-americano. É o projeto básico de Luiz Antonio Gomides – que auxiliado por seu amigo José Carlos Biston, construiu uma Motovolks 1500, há dois anos, bastante aperfeiçoado, com planos de ser produzido em série, num misto de soluções industriais e artesanais. A Amazonas 1500 se tornou, no mínimo, a mais sofisticada versão de moto com mecânica Volks construída no Brasil.

 

A Auto Importadora Ferreira Rodrigues – uma empresa de autopeças – se interessou pela moto e resolveu apoiar o construtor para que desenvolvesse e aperfeiçoasse a Motovolks 1500 tornando viável seu lançamento comercial. Com melhores condições financeiras e de trabalho, Luiz, auxiliado por vários mecânicos, conseguiu melhorar bastante o acabamento da moto, tornar a estética e a mecânica bem mais integradas, concluir o desenvolvimento da parte elétrica e instrumentos e continuar evoluindo com soluções mecânicas.

 

O design escolhido para a moto – com paralamas, tanque, bolsas laterais, cúpula de farol e instrumentos em fibra de vidro – mostram várias tendências: desde o farol quadrado (semelhante ao da Yamaha XS 1100), passando pelo aspecto visual “espalhafatoso” (das Harley) até uma “carenagem” de motor com influências automobilísticas. A moto avaliada com exclusividade foi a primeira a ser concluída e vários detalhes ainda seriam modificados – como lanternas traseira e direcionais, escapes, grades de refrigeração. No entanto, seu estilo nada tem a ver com a primeira Motovolks, chegando a resultados mais coerentes com o enorme porte da moto, ainda que discutíveis. O estilo “grandioso” foi necessário, em parte, pelas dimensões do motor e câmbio, VW, e também pelo grande número de componentes automobilísticos usados na Amazonas: a maioria é da própria linha VW (painel com velocímetro, conta-giros e luzes indicadoras, botões de comandos elétricos do Passat; cilindros e pinças de freio, amortecedores traseiros, relês, caixa de fusíveis e outros equipamentos elétricos da linha VW convencional). Mas, foram aproveitadas peças de outras marcas de veículos: farol dianteiro do caminhão Mercedes-Benz, discos de freio de Corcel, entre outros.

 

O maior aproveitamento de componentes Volkswagen, segundo os fabricantes, se deve à escolha do motor e câmbio – novos e com garantia – para ter uma manutenção que pode ser feita por oficinas especializadas VW, além da facilidade de se encontrar peças de reposição, com preços bem mais acessíveis. Os comandos de guidão, em liga leve, foram desenvolvidos especialmente para a Amazonas, e há um cilindro de freio VW acoplado na direita, além de todos os comandos elétricos distribuídos nos dois manetes (partida, piscas, faróis, buzina, sinalizador de luz etc). Também para facilitar a manutenção, todos os relês e fusíveis foram colocados numa caixa única, na lateral da moto. Quanto aos reparos, uma das operações mais trabalhosas talvez seja o conserto do pneu traseiro, que exige a retirada dos suportes do paralama e das bolsas laterais, além das operações normais. A parte elétrica, em relação à primeira Motovolks, foi bastante aperfeiçoada, chegando à sofisticação, com recursos como várias luzes indicativas no painel, e luz de ré, que se acende quando a marcha a ré é engatada, numa alavanca em separado, embaixo do banco.

 

A mecânica

 

A parte mecânica foi a que teve menor número de modificações, sempre comparando com a primeira moto de Luiz. O sistema de refrigeração, com a “carenagem” de motor, tem agora ventoinha plástica, além da refrigeração “forçada” pelas aberturas na carenagem. A cobertura frontal do motor deveria ter também grades, como nas laterais para melhor aproveitamento da forte ventilação que penetra entre os telescópicos com a moto em movimento, para evitar superaquecimento principalmente em trânsito urbano. O câmbio teve seu acionamento modificado, com novo trambulador do lado esquerdo e a corrente de transmissão do direito. As marchas estão mais fáceis de engatar, mas o acionamento do pedal (com o pé esquerdo) ainda é um pouco duro. O quadro e as suspensões são de fabricação própria, o sistema dianteiro é telescópico, com molas externas, e a traseira tem curso sobre um eixo vertical, com molas e amortecedores (da Kombi) externos. Esta suspensão traseira é semelhante à usada em grandes cilindradas da década de 1950, um sistema ultrapassado, que absorve pouco as ondulações da pista. Para compensar parcialmente esta dureza da suspensão (a dianteira também é bastante rígida) um amortecedor com mola acoplada foi colocada sobre o selim, que deveria ser estofado com espuma mais densa. Apesar dos 275 kg da Amazonas a suspensão poderia ser mais progressiva e macia.

 

O comportamento geral lembra bastante as Harley 1200 e sua estabilidade está mais relacionada com seu peso e o baixo centro de gravidade proporcionado pelo conjunto mecânico, do que com o tipo de suspensão utilizado. Para manobras e trânsito intenso, é necessário um “piloto” razoavelmente atlético, habituado com as cilindradas automobilísticas de motos norte-americanas. Com a quarta marcha engatada, em estradas asfaltadas, a Amazonas é mais confortável, lembrando pouco a difícil tarefa de conduzí-la em tráfego intenso e manobras.

 

O motor tem bastante torque em baixa rotação, mas é pouco elástico, características um pouco abrandadas pelas dupla carburação de 32 mm e um distribuidor mais “esportivo”. Sua arrancada é lenta, um pouco compensada pela capacidade de manter velocidades constantes e de exigir pouca troca de marchas. Os freios funcionam satisfatoriamente, prejudicados pelo manete dianteiro, muito afastado da manopla. Porém, a maior dificuldade é o acionamento mecânico da embreagem, muito duro, que deveria ser hidráulico. A vibração foi bastante atenuada com a montagem do motor e câmbio sobre coxins de borracha, assim como o guidão, também sobre coxins. Permanece o efeito giroscópico, com a moto inclinando-se lateralmente, no sentido inverso da rotação do motor como ocorre nas BMW, pelo fato do virabrequim estar montado no sentido longitudinal. Segundo o fabricante, o consumo está em torno de 20 km/litro a 80 km/h e a velocidade máxima próxima dos 170 km/h.

 

Conclusão

 

A moto avaliada ainda tinha vários itens que seriam revistos, – além de outros sugeridos por Duas Rodas – e é provável que até seu lançamento, ainda neste semestre, boa parte dos problemas já estejam solucionados. O acabamento se tornou bem mais próximo das grandes cilindradas, mas as dificuldades para conduzí-la podem limitar ainda mais esse restrito mercado dos que podem gastar um bom dinheiro numa moto. A vantagem mais evidente é a facilidade de manutenção, com peças nacionais facilmente encontradas e com preços acessíveis, além de uma mecânica já utilizada em vários projetos de pequenos fabricantes de jipes, buggies e outros veículos. A capacidade de produção da AME (Amazonas Máquinas Especiais) é de até 20 unidades mensais, coerente com as possibilidades de mercado que a moto pode encontrar. Um contato mais real com este mercado deve ser feito em breve, com o lançamento de uma Amazonas 1500, que segundo o fabricante, será mais completa que o modelo pré-série avaliado.

 

 

 

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